Ariane (dir.) com a irmã, ambas guardiãs de Nossa Senhora de Assunção

Os primeiros raios da alvorada desta quinta-feira, 15 de agosto de 2019, não serão esquecidos por Ariane. Ela repetirá um rito que surgiu da devoção à Maria, virou um sonho e se tornou, enfim, uma missão carregada, literalmente, durante seis anos. Amanhã, sexta-feira, ela dará adeus ao posto de guardiã de Nossa Senhora de Assunção. “O sentimento é de dever cumprido. A ansiedade está tão grande, que fico emocionada só de pensar”, diz.

A admiração por essa missão é antiga, assim como a sua devoção. Desde pequena, Ariane acompanhava aquele grupo de 47 moças e 20 moços que se revezam sob o andor, que pesa aproximadamente 250 quilos. Achava lindo! Por volta dos 21 anos, ela resolveu se candidatar, colocou seu nome em uma lista e esperou mais de um ano até ser chamada. “Eu nem acreditava que estava mesmo acontecendo”.

O dicionário Houaiss define “assunção” como um substantivo feminino relacionado à “subida do corpo de Maria ao céu, onde de novo se reuniu à sua alma”, um dogma definido pelo papa Pio XII, em 1° de novembro de 1959. E é exatamente isso que Nossa Senhora de Assunção representa: a elevação de Maria de Nazaré à gloria celestial, após uma vida terrestre repleta de provações e fé.

Concebida sem pecado, ela resistiu às dúvidas, à pobreza, à perseguição e à morte do Filho. Teria morrido dez anos depois de Jesus, antes da dispersão dos Apóstolos, no ano 42 ou 44, aos 60 anos de idade. “A tradição antiga, tanto escrita como arqueológica, localiza a sua morte no Monte Sião, na mesma casa em que seu Filho celebrou os mistérios da Eucaristia e, em seguida, tinha descido o Espírito Santo sobre os Apóstolos”, diz a Canção Nova.

Na tradição são-roquense, Nossa Senhora de Assunção é a protagonista da procissão de todos os santos das comunidades, que acontece no dia 15. No dia seguinte, é Ela quem abre caminho para São Roque, o padroeiro da cidade. As guardiãs, como Ariane, assumem o andor na porta da igreja e o carregam a maior parte do percurso (aproximadamente 2 km) nos dois dias.

Mal acaba uma festa e já se inicia o planejamento da outra. O andor é decorado uma semana antes do dia 15, sempre com as portas fechadas, para não estragar a surpresa dos moradores e turistas. Os vestidos brancos das meninas representam a humildade e a pureza de Maria. Ainda que o rito seja o mesmo, ele parece se renovar aos olhos dos devotos. “A cada ano é uma emoção diferente. Vemos no olhar das pessoas o amor por Maria. Quando carregamos seu andor, passa um filme na cabeça e é impossível não agradecer por tudo. É um sentimento apenas de gratidão. No ano passado, uma senhora me parou depois da procissão, pegou na minha mão e falou que via o quanto eu era amada por Jesus”.

Para Ariane, “a fé é o que nos faz perseverar nas promessas de Deus, que pode até tardar, mas não falha, porque nada é impossível para Ele”. Ela diz que o coração aperta ao pensar na despedida, mas “a vida é cheia de ciclos e é preciso fechar um para começar outro”. Neste caso, ela e o noivo fazem planos de  começar uma vida juntos.

Ariane pode deixar o posto de guardiã, mas jamais abandonará Nossa Senhora. Afirma que continuará a servir a igreja, assumindo, de repente, outras funções – ajudando mais no planejamento e na decoração ou servindo água “às meninas”. Sabe até que, em algum momento, acompanhará somente o cortejo. Quem sabe não será a oportunidade para descobrir um novo ângulo de um momento que para ela é o mais emocionante. “Quando Nossa Senhora sai da igreja, todos os olhares estão voltados para ela. Arrepia só de lembrar”.