
Eu sabia muito pouco sobre Alaíde Costa, mas me emocionei assim que subiu ao palco do Sesc Pompeia. Ela, que começou a cantar ainda menina, tomou gosto pela coisa ao se inscrever em concursos de música. Encontrou-se neste caminho e se entregou a ele.
Diz que, aos 88 anos, desfruta de uma fama inédita. Na plateia, havia poucas cabeças brancas – uma surpresa, pois sua música não é aquela que toca nos programas de TV ou ocupa a liderança dos streamings. Ela faz um som diferente, que me fez lembrar dos boleros do meu pai. Tem história, elegância e sentimento.
Logo no início do show, pede desculpas à plateia. Diz que não gosta de cantar lendo, mas já não consegue decorar tantas letras. Quando fala, sua voz é tímida, doce e miúda, um contraste com o canto profundo. Alaíde não engole sílabas, não se rende a gírias. Não grita nem faz alarde. Pronuncia as palavras com devoção. Polvilha cada uma delas com emoção. Faz uma breve pausa entre as canções para dividir os créditos de suas joias com os compositores – nomes consagrados como Nando Reis, Johnny Alf, Ivan Lins & Emicida, Guilherme Arantes, Carlinhos Brown & Marisa Monte.
Em um figurino elegante, à la Dionne Warwick, ela se mantém em pé durante o show, demonstrando uma disposição como poucos. No passado, diziam que ela, negra, deveria cantar samba, mas esse não era o seu estilo. Fã de Silvio Caldas, preferia bossa nova e MPB. Não podia nem queria fazer de outro jeito. Pode parecer teimosia, mas Alaíde é entrega. A música é sua missão. Cantar é seu propósito.
Emociona sua coragem para persistir no próprio caminho, apesar das adversidades, das modas e dos modismos. Emociona o amor pela arte, mais do que pela fama. Emociona os aplausos tardios, verdadeiros e intensos.
Saí do show com a alma lava, segura de que o mundo não está tão perdido assim. A gente só precisa ajustar a lente, bloquear interferências e sintonizar na frequência certa.
PS: Quando escrevi bolero, o corretor trocou para boleto. Brincadeira sem graça e mais uma prova das inevitáveis distrações e aborrecimentos do caminho. 😉

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