Atire a primeira pedra quem nunca sentiu o peso do mundo sobre os ombros. “Ao longo da minha vida eu sempre quis ser alguém melhor: uma filha que resolve tudo em casa, boa profissional, boa aluna no Inglês e na faculdade, uma boa namorada, boa amiga, conselheira e fiel. Ser uma boa garota também era o que esperavam de mim”.
Só que se paga um preço alto por essa perfeição. E Vanessa sabe bem disso. “Eu sabotava inconscientemente as minhas ações em uma busca constante por aceitação. Sempre tive todos os meus minutos ocupados, fazendo inúmeras coisas que nem lembro mais exatamente o que eram. Nunca tinha um momento só meu, aquele minutinho que eu estava fazendo algo só por mim. Na minha antiga cabeça, isso era egoísmo”.
A “louca” vontade de viajar sozinha ou de fazer um intercâmbio era devorada por aquela vida sob rédeas curtas que ela mesmo havia escolhido e que se revelava implacável como uma avalanche. As economias foram aplicadas em um carro, quando a mãe não conseguia mais andar de ônibus. Viajou para o Nordeste com uma amiga na mesma data em que embarcaria para a sua lua de mel. E isso nem se compara ao que ainda estava por vir: a mãe ficou muito doente e foi internada em uma casa de repouso. Decepções se acumularam e a paz de espírito sumiu.
Até que um dia Vanessa resolveu confiar no que você pode chamar de acaso. Era uma voz interior que sempre lhe dizia: “Siga em frente que tudo estará em seu lugar”. Ela abriu a sua agenda e mirou o mapa do Brasil na última página. “Olhei, olhei e pensei em todo o tempo que tive vontade de fazer uma viagem sozinha, em quanto amo as maravilhas naturais do Brasil. Decidido! É isso o que EU quero fazer!”
Levou 44 dias para percorrer 10 cidades brasileiras, sendo a primeira delas Lapinha da Serra, em Minas Gerais, onde morava um amigo de infância que não via há 17 anos. “Quando desembarquei na rodoviária de BH, tive certeza, tive medo e vontade de chorar. A mochila pesava muito e eu toda perdida pra lá e pra cá, procurando onde pegar o ônibus para a Serra do Cipó. Consegui! Mas ainda precisava de um transfer até a Lapinha. Escutei uma menina perguntando ao motorista do ônibus e colei nela”.
Foi o início de uma jornada de trocas com velhos e novos amigos que conheceria pelo caminho. “O meu próximo destino seria Ouro Preto, mas segui a dica dos novos amigos e fui para Chapada dos Veadeiros (GO). Quando coloquei a mochila nas costas novamente, ainda em MG, percebi que todo aquele peso que achava quase insuportável era excesso de MEDO. Agora eu já estava mais confiante e o peso da mochila era completamente compatível com o que eu precisava carregar”.
Na rota definida, às vezes ao acaso, ela acampou, fez couchsurfing, ficou em hostel e na casa de amigos. Uma fase de desapego e de preparo para o próximo passo. “Quando eu decidi viajar pelo Brasil, resolvi vender todas as minhas coisinhas, principalmente a minha cama de casal gigantesca. Um dos motivos era sair da zona de conforto e me preparar para o intercâmbio”.
Na Austrália, onde estuda inglês de segunda a sexta, ela mantém a dieta espartana. “Faço tudo a pé para economizar. Não passo fome, porque me viro bem na cozinha, mas só faço o essencial todos os dias”.
Viver com muito menos é somente uma das lições que aprendeu. Vanessa sabe que hoje é capaz de resolver problemas mesmo em um idioma que não domina, desenvolveu bom humor para rir das dificuldades e valoriza a opinião das outras pessoas, sem desrespeitar as suas necessidades e tendo consciência de que isso não é egoísmo. “Esse tempo sozinha me ajudou a descobrir que eu gosto de estar só. Essa solidão me proporciona felicidade e não é a mesma alegria de estar com os amigos, família ou alguém que você ama. Esse tempo me revelou que posso desejar e realizar algo que trará benefício exclusivo para mim e que, se eu não ferir outra pessoa, está tudo bem em seguir em frente. Estar sozinha, sem as pessoas que eu mais amo por perto, me ensinou que para amá-las, eu não preciso viver a vida delas e nem tentar dizer como elas devem viver, porque isso transforma o amor em apego e o apego sufoca, poda e atrapalha a evolução de todos nós”.
Vanessa entendeu que as incertezas do futuro podem, às vezes, assustar — e não só a ela, a todo mundo. Só que o seu coração corajoso já lhe ensinou o caminho. “Escute o seu coração. Tire um tempo só para você, esteja sozinho em um lugar onde se sinta em paz e converse com você mesmo ou com Deus, como preferir. Respire fundo e escute. Sim! É possível ouvir as respostas para as suas dúvidas!”
Seja cruzando o planeta ou naquele cantinho do seu lar, por que não fazer isso hoje?
16/10/2015 at 12:24 am
Vanessa sua história é linda, e confesso que fiquei com o coração muito acelerado. Jamais poderia imaginar que aquela menina que falava comigo baixinho todos os dias e adorava tomar seu café, e comer seu lanche preferido bem torrado de Pão integral, peito de peru ,queijo branco e tomate ,sempre no mesmo horário. Como pode ser tão aventureira e corajosa? Está é a certeza de que não fazemos ideia do que as pessoas realmente são. Vanessa parabéns pela sua história, e não esqueça que eu estarei sempre nas arquibancadas da vida torcendo por você. Tatiane Lima, muito obrigada pela história, eu sou sua fã!!!
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11/12/2022 at 11:08 pm
Prezada autora, Srta. Tati !
Adorei o relato da Vanessa, de como eh bom descobrir o “bem” que o estar soh pode nos trazer !
Pq eh tao dificil as pessoas aceitarem essa procura de PAZ, do silencio, do ouvir a nos mesmos ?
Acabamos taxados de estranhos ou esquisitos ! O que as pessoas nao sabem eh o quanto ganhamos com isso, independente de ama-las.
Acredito que a personagem Vanessa eh que eh normal e esta no caminho certo ! Incrivel, mas nao fazermos parte da massa “dita” normal……… eh um presente de Deus ! Agradeco por estar entre esses poucos escolhidos !
Abs. e parabens pelo precioso texto.
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11/12/2022 at 11:13 pm
Obrigada pela visita, pela leitura e pela partilha, caro leitor Renato Jr. Gosto da coragem da Vanessa, que está lá do outro lado mundo, se descobrindo e descobrindo o mundo do jeito que bem lhe entende. Gosto de gente assim. Gosto de saber que é assim também. 😉
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