É do Terminal Tietê que sai o ônibus que leva ao melhor pedaço de céu. Pode-se levar de 24 a 30 horas para chegar lá, mas quem se importa em esperar?
A travessia dá à paulistana Vilma a oportunidade de refletir. “Sempre penso naquela frase: a gente precisa saber de onde vem para saber para onde vai”. E é em Tabocas do Brejo Velho que estão as raízes da sua família. Foi desse pequeno município baiano, bem próximo de Goiás e com apenas 12 mil habitantes, que sua mãe partiu para buscar tratamento médico na capital paulista no início da década de 70. É é lá onde Vilma recarrega suas baterias anualmente.
Instalada na generosa casa dos avós, ela acorda com os passarinhos e passa o dia de chinelo, bermuda e regata ou com um vestido de tecido leve. Tabocas aguça o olfato de Vilma. Quando pensa naquele pedaço do sertão baiano, sente o cheiro da terra grossa, de manga e do doce pequi sendo cozido.
Os dias ali são generosos: as horas não são apressadas e parecem estar em total harmonia com a natureza. Pode-se ir até a roça para ver a plantação, nadar no açude ou ainda fazer uma trilha pelo morro. As visitas à casa da tia são quase diárias. Nunca falta assunto nem muitas risadas. Ela tem ali a certeza de que seu humor vem daquele mesmo novelo. “ É impressionante a sagacidade deles para contar causos e tirar sarro da sua cara. Todo o meu lado irônico vem dali”.
Entre as incontáveis rodas de conversa, uma delas foi muito especial. Em 2002, sua avó, que não tinha lá muita paciência com crianças, puxou-a para perto e contou, no seu próprio tom, sua história de vida: a infância em Tabocas, o casamento e as dificuldades para criar a filha. “Aquilo foi lindo, eu nunca vou esquecer. Até minha mãe ficou escutando”.
A sabedoria de Dona Joana continua sendo compartilhada em noites de luar, quando a família se reúne em um canto do terreno para admirar as estrelas. “Fica todo mundo em pé, olhando pra cima e relembrando o que a vó ensinou sobre o céu – das Três Marias ao Caminho de Compostela; arriscamos a previsão do tempo, o impacto na lavoura e recordamos vários momentos da vida”. Vilma jura que nem no Atacama o céu é tão bonito quanto naquele pedaço do mundo.
No fim das férias, ela está pronta para a próxima etapa da vida. Só que não é só energia e inspiração que ela leva do seu pedaço de céu. “Sempre saio de lá sentindo orgulho da integridade e da inteligência emocional da minha família e, acima de tudo, me sentindo muito amada”. Como diria o melhor tradutor do sertão brasileiro, João Guimarães Rosa, “o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando”.
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