Como filhos de Hebe, a deusa da Juventude e da Imortalidade, nós surtamos a cada ruga e fio de cabelo branco. Em maior ou menor proporção, investimos parte do nosso salário e tempo para barrar ou desacelerar um processo que, gostando ou não, é natural. Esquecemo-nos que o mais difícil ainda está por vir: a perda de autonomia, refletida nos passos mais cuidadosos, no fôlego mais curto ou na memória roubada. Como nos preparamos para isso? Como será o nosso futuro? A fotógrafa Nellie esbarrou nessa e em outras questões quando a mãe foi diagnosticada com Alzheimer há mais de dez anos. 

Sua preocupação faz todo sentido. Dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) mostram que a expectativa de vida na região aumentou de 55,7 para 74,7 anos, enquanto a taxa de fecundidade caiu de seis para dois filhos por mulher. Os índices levam em consideração dois períodos: de 1950 a 1955 e de 2010 a 2015. A mudança nas duas taxas causa uma série de desafios para o país e para as pessoas, que precisam planejar melhor seus passos.

Nascida em 1955, Nellie é um exemplo de uma geração que continua a quebrar paradigmas comportamentais. Construiu uma bem-sucedida carreira em grandes revistas e se tornou mãe aos 40 anos. Para acompanhar mais o filho, traçou um plano B e ganhou flexibilidade, sem perder em prazer, com a fotografia de família. Quando a doença da mãe surgiu, a inquieta fotógrafa percebeu que precisava enxergar além da lente de filha. Aos 55 anos, foi buscar respostas na sala de aula. Fez enfermagem e pós-graduação em Gerontologia, um campo multi e interdisciplinar que lida com envelhecimento e velhice. “Uma forma que encontrei de amarrar o estudo com a fotografia foi montar a Gero-Lero, que é especializada em festas, retratos e ensaios para o público acima de 60 anos”.

Com seu novo negócio, Nellie passou a ser testemunha da vida que nos recusamos a aceitar. Só que o envelhecimento, essa palavrona tão feia, não está necessariamente ligado a sofrimento, mas indubitavelmente à celebração de, veja só, vida. “Na semana passada, fiz uma festa de 100 anos. Fotografei uma boda de 70 anos também!”.

Sua busca para decifrar o envelhecimento ganhou mais um capítulo no ano passado, quando decidiu cruzar 9 mil quilômetros  para entrevistar e fotografar 447 mulheres, todas contemporâneas, preferencialmente no dia do seu aniversário. “Eu só conhecia pessoalmente cerca de 60 delas. As demais foram aparecendo”.  Entre cliques e confissões, cada sessão levou de 1 hora e meia a 5 horas. Tendo como base a diversidade paulista e brasileira, o trabalho é um rico documento sobre memórias, origens, atividades e a realidade dessa geração.

O aprendizado foi tão intenso e profundo que Nellie sente dificuldade em sintetizá-lo, mas o expõe em imagens e palavras durante exposições e simpósios. Um deles acontece na próxima sexta-feira (25/11) durante o Ciclo de Ideias promovido gratuitamente pela ONG Colmeia, pioneira em orientação profissional de jovens.

Entre tantas incógnitas e variáveis, a fotógrafa revela que essa jornada de caça-respostas já rendeu alguns frutos. “Ser idosa agora não é nem um pouco assustador – pelo contrário, tenho muito orgulho”. Tem estudado muito também sobre organização, em todos os sentidos, “para conquistar um envelhecimento mais saudável e ativo”.

Com seu protagonismo e vivacidade, Nellie está compartilhando sem querer  um dos mais desejados segredos da humanidade. Afinal, como um dia disse Sophia Loren, uma Hebe da vida real, “existe uma fonte da juventude: está na sua mente, nos seus talentos, na criatividade que você injeta na sua vida e na vida das pessoas que ama. Quando você tocar nessa fonte, você terá definitivamente derrotado a idade”.

Serviço:

Ciclo de Ideias – ONG Colmeia.  Rua Marina Cintra 97. Data: de 24 e 25 de novembro de 2016, das 11 às 17h. Entrada gratuita