Luiza só queria comprar um remédio para dor de cabeça quando foi lembrada da sua condição. Ela não tinha percebido os olhares lançados em sua direção enquanto esperava na fila e falava com a mãe, em Português, por telefone. “Volte para o seu país”, disse um senhor ao esbarrar com certa violência nela. Todo mundo viu, ninguém se manifestou a seu favor. Foi, então, que ela se deu conta: após deixar o Brasil e conquistar outra cidadania, ela virou uma estrangeira – no país onde nasceu, no país que a acolheu.
José conhecia bem esse sentimento. Como muitos, ele deixou o sertão nordestino para sobreviver em São Paulo. Morava na Zona Leste e trabalhava como guarda noturno em um condomínio da Zona Sul. Pouco convivia com amigos e familiares, mal conhecia os colegas do edifício onde passava seis noites da sua semana, era somente uma sombra para os moradores daquele prédio.
Júlia, após passar mais de uma década casada, voltou a ser solteira e resolveu encarar o tal do aplicativo de namoro. Sentiu-se uma estrangeira explorando um território tão diferente do que conhecia. Em uma viagem sem destino certo, ela se apoiou na sua curiosidade para entender os códigos, para descobrir os humanos por trás dos avatares e para elencar os atrativos dessa nova forma de se relacionar. Sabia que aquele não era seu habitat e que um dia voltaria para casa – nem que fosse sozinha.
João se sentia um desconhecido até entre os amigos de longa data, que não se conformavam com o seu comportamento. Perder o sagrado futebol? Deixar de comer carne e beber refrigerante? Trocar o apartamento maneiro no melhor bairro de São Paulo por uma edícula no interior? Para eles, João resolveu, sem aviso prévio ou discussão em plenário, mudar seu estilo de vida e criar um abismo entre eles. Nem a mesma língua falavam mais, aparentemente.
Como escreveu Clarissa Pinkola Estés em “Mulheres que Correm com os Lobos”: “Sermos nós mesmos faz com que acabemos excluídos pelos outros. No entanto, fazer o que os outros querem nos exila de nós mesmos.”
Ao final, querendo ou não, recai sobre nós uma única escolha: exilados ou estrangeiros.
12/08/2021 at 8:47 am
O tempo e o melhor remédio. Seja voce mesmano nn0; Muitas pessoas passam por problemas semelhantes ou piores. Voce e´ maravilhosa, palavras de quem te conhece muito bem e te ama muito. Ele sabe o que faz e no momento exato voce terá a solução. Tudo passa………
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