Melissa, ao fundo e de óculos, com o grupo na Basílica de Nazaré

Melissa havia planejado passar apenas algumas horas na Turquia, o suficiente para pegar uma conexão para o Egito. No final, foi bem mais do que isso. Seu avião pousou em Istambul minutos após o atentado, que deixou mais de 40 mortos e 140 feridos, em junho passado. Não havia internet, os telefones não funcionavam direito, as informações eram escassas e, muitas vezes, desencontradas. Ainda assim, o que ficou para ela não foi pânico ou medo; mas uma experiência de fé e compaixão. 

Sócia de uma agência de turismo religioso, Melissa percebe hoje que a viagem foi desde o começo incomum. Ela escolheu um voo diferente do usual, porque queria que seus passageiros tivessem uma boa noite de sono antes de iniciar a peregrinação religiosa por Egito e Israel. A saída do Brasil também foi tumultuada, porque duas clientes ficaram para trás por não terem levado a documentação necessária. Nada se compara, porém, a chegada à Turquia: o aeroporto de Ataturk estava mais silencioso que o costume, os atendentes de solo da companhia aérea menos atenciosos, o display de voos congelado. Sabe aquela sensação de que alguma peça está fora de lugar?

Melissa encontrou, então, um cantinho perfeito para o grupo de onze pessoas – próximo a banheiros, restaurantes e até a um Duty Free. Só que nem todos os estabelecimentos funcionavam; os poucos funcionários presentes abraçavam-se e choravam. Uma das suas passageiras traduziu o que duas japonesas comentavam: a explosão de bombas e um tiroteio acabara de acontecer. Atiradores estavam sendo procurados. Seria só um boato? “Meu primeiro sentimento foi de negação. Eu invisto no planejamento, sempre coloco minhas viagens em oração, como aquilo estava acontecendo?”.

Ela reuniu o grupo em um local e foi em busca de um funcionário, do aeroporto ou da companhia aérea, que pudesse prestar mais informações. Se ela sentia medo? “Eu pensava: e se eu cair? E se eu fraquejar? Essas pessoas cairão junto. Então, eu preciso ser o porto seguro delas”. Descobriu que um atentado havia mesmo ocorrido no aeroporto, mas em uma área distante de onde eles estavam e já isolada pela polícia. O funcionário garantiu que eles estavam seguros naquele local. Foi essa mensagem que ela repetiu para o grupo, que, ao longo de quase seis horas, multiplicou-se por cinco. Naturalmente, outras foram pessoas se aproximando e se mantendo próximas.

Por volta das 4 horas da manhã, uma nova orientação foi recebida: o aeroporto seria evacuado. “Eu perguntava: O que nos espera lá fora? E a resposta mais comum era: não sei”. Com o apoio da equipe da agência no Brasil, tudo foi organizado: o grupo foi alocado em um hotel e até um ponto de encontro eles tinham, caso alguém se perdesse. O trajeto parecia longo demais, principalmente para quem saiu de um cantinho seguro e tranquilo e foi obrigado a encarar uma realidade incerta e cruel. “Havia manchas de sangue por toda parte; corpos, malas abandonadas e até ursinho de pelúcia”. Para Melissa, esse cenário de filme de terror não se compara às expressões de dor e ao exemplo de superação. “Os funcionários [do aeroporto e da companhia aérea] tinham a tristeza no rosto e tentavam ao máximo, organizar e normalizar a situação”.

No conforto e na segurança do hotel, uma nova e forte experiência aconteceu. Foi ali que ela começou uma corrente de orações, inspirada pelo próprio nome do grupo – Em Sintonia com Nossa Senhora. Foi ali que ela obteve a resposta que tanto buscava. “Eu ouvi a voz de Maria dizendo: calma, vai dar tudo certo. Todo mundo embarcará junto”. E foi justamente o que aconteceu: assim que as operações se normalizaram no aeroporto, o voo foi remarcado em tempo para que as duas outras passageiras que ficaram para trás se unissem ao grupo. Na saída de Istambul, um funcionário da Imigração, ainda abatido, fez um pedido: “Voltem logo. Não deixem de visitar a gente, por favor”.

A visita à Terra Santa seguiu sem incidentes. O grupo voltou contente e sem trauma com a inesperada experiência. A própria Melissa diz que não tem medo de viajar e faz planos, inclusive, de voltar à Turquia. Os atentados recentes à França sacramentaram sua nova visão sobre esses conflitos. Ela passou a vê-los de outra forma. “Eu já achava um absurdo, sem sentido e sem propósito. Só que o que eu vi foi, principalmente, dor, desconsolo e tristeza”. Em vez de fortalecer o terror e o medo, os atentados estão espalhando sentimentos completamente opostos: compaixão e amor.